OS 60 ANOS DE CARREIRA DOS SCORPIONS E UMA REFLEXÃO SOBRE SABER "A HORA DE PARAR"
- IA Santos
- 22 de abr.
- 4 min de leitura
Velhos Demais Para o Quê?

O feriado do dia 21 de abril sempre me fez lembrar muita coisas. Porém, acredito que o 21 de abril de 2025 se tornará particularmente inesquecível. E com todo respeito ao Papa Francisco, não é dele que estou falando. Me refiro, na verdade, ao show dos Scorpions, que aconteceu no Rio de Janeiro, como parte da turnê em comemoração aos sessenta anos de carreira da banda.
Desculpe, mas não vou dedicar parte desta crônica para dizer quem são os Scorpions. Por dois motivos: o primeiro é que você provavelmente já conhece e o segundo é que se você não conhece, pare de ler agora e vá conhecer.
Voltando ao show. Fui acompanhado de minha esposa e seu irmão (ambos fãs incondicionais da banda) e a esposa dele. Eles decidiram chegar cedo - dez horas antes do show começar - para ficarmos na grade. Perdi as contas de quantas vezes fiz isso quando tinha meus vinte poucos anos, mas quando minha esposa e meu cunhado apresentaram eufóricos tal plano, imediatamente pensei: "estou velho demais pra isso".
“Estou velho demais pra isso.” Quantas vezes você ouviu (ou mesmo disse) a frase sem perceber o peso da desistência disfarçada?
Velho ou não pra qualquer coisa, segui o plano. E lá fui eu passar horas e horas com minha família; me alimentando de biscoito, matando sede com água quente, sentado no chão rezando para não chover ou ter que arrumar confusão com algum metido a besta que tentasse roubar nosso lugar na fila improvisada. Cada vez que sentia vontade de mijar eu pensava: "estou velho demais pra isso".
Mas ao contrário do que a descrição acima faz supor, o dia revelou-se surpreendentemente divertido. Tantos anos se passaram que eu havia esquecido como era legal fazer "amizade de fila" com completos desconhecidos. Conhecemos figuras notórias, como o André - o autoproclamado "organizador de filas" - que em uma sequência de atos de puro e genuíno altruísmo tomou para si a tarefa de organizar a fila do evento de forma tão dedicada e competente que o fez merecedor de aplausos não são dos fãs, como também dos reais organizadores. Coisas como essa eu vi muitas vezes "quando era jovem".
Finalmente entramos na casa de show e tomamos nosso merecido lugar na grade, exatamente em frente ao palco, como planejado. Olhei ao redor e vi pessoas de diferentes idades, algumas que viveram aqueles sucessos na juventude e outras que provavelmente herdaram dos pais o gosto pela banda. Todos vibravam parecendo entender o privilégio de estar ali. Imediatamente fui tomado por uma sensação muito familiar, uma euforia que eu atribuiria a mistura de juventude e embriaguez, mas que agora eu sentia mesmo estando "velho" e sóbrio. Deveria ter percebido ali o meu equívoco, mas ainda estava cético.
Tão cético que quando a voz limpa e potente de Klaus Meine invadiu nossos ouvidos junto aos gritos e aplausos da multidão, cheguei a pensar que fosse playback. Afinal, como um senhor de setenta e seis anos poderia ainda cantar daquela maneira? Como os tantos que comentaram sobre o cansaço e a "vergonha alheia" dos shows anteriores em Brasília e São Paulo poderiam estar tão errados? Pois é, eles estavam. E eu também!
E não apenas errado sobre a crença de que músicos com mais de 70 anos, com seus cabelos brancos, rugas e peles flácidas, jamais poderiam ainda ser capazes de dominar um palco sob luzes coloridas e preencher um estádio com a energia e o carisma de seis décadas atrás. Eu também estava errado sobre mim e a suposição de que eu também estava velho para isso e para qualquer outra coisa.
"Ah, mas o cara não corre mais de um lado para outro como fazia antigamente", você pode argumentar. Mas o que importa? Sim, havia limitações. Os passos mais contidos, as pausas mais frequentes, e a voz que até poderia apresentar sinais de cansaço, embora em momento algum pareceu demonstrar (exceto talvez durante um instante de Still loving You), nada disso diminuiu a entrega, a energia ou a emoção com que tomaram conta da plateia. Cada solo, cada refrão entoado em coro, eram as provas de que há vitalidade em quem ainda carrega sonhos, mesmo com os joelhos cansados. Bastava observar aqueles senhores em cima do palco, entregues de corpo e alma à música, para entender que a idade não é freio quando a paixão ainda pulsa. Talvez o rock tenha mesmo esse poder, afinal: o poder de suspender o tempo, de nos fazer sentir vivos, intensos, imortais por alguns instantes.
Mais do que uma apresentação musical, para mim, o show foi uma lição de vida. Um lembrete de que nunca é tarde demais para recomeçar, para continuar, para se reinventar. Que os projetos engavetados ainda podem ganhar forma. Que a idade não deve ser argumento para a desistência, mas sim um troféu de persistência.
E que fique registrado: na noite de 21 de abril, o Rio de Janeiro celebrou não apenas os sessenta anos de uma banda, mas uma história viva que não apenas marcou, mas ainda marca gerações por onde passa. Um grito. Um manifesto contra a ideia de que existe uma idade certa para fazer o que se ama ou para parar de sacudir como um furacão.
I.A. Santos
(Que descobriu já adulto que a primeira estrofe de "Wind of Change" não era em francês)
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