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IA ENTREVISTA: HUGO BIANOR

  • Foto do escritor: IA Santos
    IA Santos
  • 24 de set.
  • 11 min de leitura
Hugo Bianor - autor de "O Gene da Rebeldia" ostentando sua vasta estante de livros e quadrinhos que servem de referência para sua carreira como escritor
Hugo Bianor - autor de "O Gene da Rebeldia" ostentando sua vasta estante de livros e quadrinhos que servem de referência para sua carreira como escritor

Certo dia um jovem de dezoito anos geneticamente modificado e mentalmente condicionado a reprimir todos os seus sentimentos se livra do chip que o mantinha preso e então acaba sendo jogado em um mundo totalmente novo sem saber o que é sentir e, principalmente, como lidar com o que está sentindo. Essa é a jornada de Ethan, protagonista de O Gene da Rebeldia, o primeiro romance de ficção científica de Hugo

Bianor.


Conversei com Hugo sobre suas expectativas, referências, desafios e alguns segredos de bastidores de sua publicação - incluindo mudanças de carreira e reflexões existenciais. Confira a entrevista na íntegra.


IA - Apesar de já sermos amigos de longa data, vamos começar do início. E a pergunta não poderia ser outra: você deixou uma carreira de sete anos na advocacia para se dedicar à literatura. Qual foi o ponto de virada que te fez tomar essa decisão tão transformadora? A partir daí teve mais quem tenha te apoiado nessa decisão ou no geral seus amigos e familiares tentaram te fazer mudar de ideia?


HUGO - O ponto de virada foi a saúde emocional. Resposta simples e direta. Não sei se é exagero especular se eu ainda estaria neste plano terrestre se não tivesse parado de advogar. Então, não foi nenhum grande insight corajoso. Foi necessidade. Agora, como acabei chegando na literatura é uma história bem maior (se ficarem curiosos está lá no meu Instagram @bianorhugo). Curiosa essa segunda pergunta, tive de parar para pensar. Seria difícil eu falar sobre família sem expor certas pessoas e situações. Vamos dizer que os parentes não opinaram (pelo menos na minha frente) porque não dou liberdade. Quanto ao núcleo familiar mais fechado, minha mãe me apoiou desde o início e continua apoiando. E quanto ao resto do mundo, principalmente quando expus no Instagram, sempre ouvi coisas boas. Elogios sobre ser corajoso e desejos de boa sorte. Ninguém nunca tentou me fazer mudar de ideia.


IA - Ainda com relação a sua antiga carreira. O mundo do direito, com suas regras, lógicas e rigidez, pode muito bem distanciar-se da ideia de liberdade que se espera de processos criativos, incluindo o literário. Você concorda com essa premissa ou de alguma maneira sua formação acadêmica influenciou e/ou ajudou no desenvolvimento da sua obra?


HUGO - Te contar uma pequena história que tem tudo a ver, mas só agora eu me dei conta. Antes de fazer Direito, eu fiz Biomedicina. Queria ser cientista. Naquela época (2009) não existia esse boom de biomédicos trabalhando com estética. A maior parte ficava na área acadêmica mesmo. Por motivos que não valem a pena citar, acabei precisando voltar do Rio, largar o curso. Precisava escolher algo para estudar aqui em Cabo Frio e as possibilidades naquela época não eram muitas. Escolhi fazer direito pela quantidade de concursos públicos. Pois bem, lá pelo final do curso, eu passei para uma prova de estágio no Ministério Público. Uma prova bem concorrida, tinha um salário bacana. Minha função era, sei lá, 90% de redação. Chegava o processo, eu redigia o que devia e mandava para o Promotor de Justiça, que alterava ou não. Isso me frustrava muito. Eu tinha de escrever conforme o Promotor pensava. Se eu fosse mais ousado, irônico, por exemplo, ele cortava. Não era o estilo dele. Foram dois anos de estágio, só 4 horas por dia e no final eu já não aguentava mais. Me sentia uma máquina, só reproduzindo o que queriam e com milhares de processos iguais. Era um trabalho “anti-criativo”. Percebi que eu nunca conseguiria trabalhar como concursado. Precisava dar minha voz as coisas e aí decidi advogar. E bom, apesar de ter a liberdade de escrever o que quisesse na defesa dos meus clientes, já sabem que a carreira de advogado não foi muito feliz.


Mas os anos advogando me ajudaram sim na escrita de ficção. Por mais que não seja um texto criativo, você usa sua voz nele. Não é muito diferente de descobrir sua voz como escritor de ficção. Fora que o texto tem de ser estruturado, ter lógica, cronologia e essas regras que você citou, mas que também são importantes no texto criativo. Não adianta nada escrever a história mais criativa do mundo se ninguém entender, né? Também ajudou na expansão de vocabulário, uso de pronomes (o pesadelo do escritor), etc.


IA - Vamos falar da sua estreia na literatura: a ficção científica “O Gene da Rebeldia”. O que atraiu você para esse gênero para seu primeiro romance? E já emendando outra questão: sei que você é um profundo estudioso das técnicas de desenvolvimento de roteiro. A estrutura e a linguagem visual do cinema de alguma forma ajudaram a moldar seu estilo literário e a maneira como você escreve este livro?


HUGO - A ficção científica aconteceu. Na época, eu estava fazendo o curso de roteiro e entre um exercício e outro escrevia um conto para tentar achar meu gênero favorito e treinar. O primeiro conto de ficção científica foi crescendo naturalmente. É um gênero muito fácil de usar para fazer críticas a sociedade o que eu gosto muito. O fato de ser possível misturar ficção científica com praticamente qualquer outro gênero também é muito bom. Mas não me vejo engessado. Está tudo muito no começo. Era para eu ser roteirista, cai na literatura, quem garante que vou continuar no sci-fi? Quanto à segunda pergunta, o básico do estudo do roteiro é o básico da literatura. Mesmo sendo jeitos diferentes de contar uma história, “regras” do audiovisual acabam virando “regras” na literatura.


Vou dar um exemplo: Uma das primeiras regras que você aprende em roteiro é : “show, don’t tell. Mostre, não conte. ” Se o personagem está com saudade da esposa, faça uma cena dele, por exemplo, ouvindo um áudio antigo dela ou vendo uma foto, ao invés de fazê-lo falar para alguém, em um diálogo expositivo “nossa, que saudade da minha esposa”, do nada. Não soa natural, não é como agimos. E, mesmo sendo algo extremamente visual, também é fundamental nos livros. Imagine a cena: “Tom entra no seu escritório desarrumado, se joga na grande cadeira atrás de sua mesa enquanto afrouxa a gravata. Enquanto se serve de um copo de whisky, não consegue tirar os olhos da foto da esposa em sua mesa. Esse parágrafo poderia ser muito bem “Tom entrou no seu escritório com o peito apertado de saudade da esposa.” Pronto, você acaba de matar uma cena. Então, sim, apesar de não ser audiovisual, o livro tem de ser “visual”.


IA - O protagonista da sua história – Ethan – lida com algum conflito ou jornada que você considera particularmente fascinante? Pode nos dar uma pequena amostra do mundo que você está criando?


HUGO - Ethan é um jovem de dezoito anos geneticamente modificado para ser mais forte e resistente. Ele tem um chip no cérebro que o impediu de ter qualquer sentimento e foi mentalmente condicionado (aqui as referências são milhares, desde o que a Alemanha fazia na Juventude Hitlerista, no mundo real, até Admirável Mundo Novo, na ficção). Ele perde esse condicionamento, se livra do chip e é jogado no mundo sem saber o que é sentir e, principalmente, como lidar com o que está sentindo. E o que é isso senão a vida? Mesmo sem chips e condicionamentos, temos sentimentos que não dominamos, muitas vezes agimos como crianças. E o que eu acho mais fascinante é que, biologicamente falando, tudo isso que sentimentos, toda essa dor e felicidade, nada mais são do que pequenas cargas elétricas no cérebro e um pouquinho de hormônio na corrente sanguínea. Uma vez eu li que somos “bombas bioquímicas” e nunca mais esqueci. Uma pessoa sofre uma fechada no trânsito, os neurônios dela carregam uma carga elétrica que vai afetar a parte da raiva no cérebro, glândulas vão jogar adrenalina no sangue e pronto, temos um assassinato. Resumindo: até onde vai nosso livre arbítrio e até onde somos governados por essas reações? Ethan vai passar por isso. Mas ele tem força sobre-humana e dezoito anos de sentimentos reprimidos. Como será tentar conter isso?


IA - “O Gene da Rebeldia” é um título instigante que pode apresentar várias camadas de significado. O processo de escolha do título final foi algo que você ponderou bastante ou surgiu mais naturalmente? Fale um pouco sobre o que esse título representa pra você.


HUGO -  O título foi a parte mais difícil para mim. Sempre tive problemas com títulos. O que me ajudou muito nesse processo foi interagir com IA. Mesmo assim foram várias e várias tentativas. Então sim, eu ponderei bastante. Como o livro trata sobre muitos temas, a IA fazia a festa. Devo ter uns 200 títulos guardados aqui. Mas uma hora eu pensei: qual a mensagem que eu quero passar? Qual a coisa mais importante? E vi que era a condição humana de se rebelar, de não aceitar perder sua liberdade. A história das revoluções não me deixa mentir. Então, na última tentativa com a IA eu expliquei isso para ela e surgiu “O Gene da Rebeldia”, o que, para mim, tem vários significados. Essa rebeldia inata que citei, o fato do protagonista ser geneticamente modificado, a forma como alguns personagens simplesmente não se conformam. Encaixou como uma luva.


IA - Se me permite um tema mais delicado, muitos artistas falam sobre uma relação complexa entre a criatividade e a saúde mental. Você se sente à vontade para compartilhar como é conviver com a ansiedade em seu processo criativo? Seja como um desafio ou, talvez, como uma fonte de insight para suas personagens e histórias.


HUGO - Eu estou nessa área há pouco tempo, mas acho que posso contribuir um pouco. Uma coisa que eu percebi que me ajuda muito: a resposta sempre vem. A história sempre progride. Mesmo que a gente não queira. Eu não me permito ficar na frente da tela em branco do Word se as coisas não estão saindo. Entendi que uma hora, seja no banho, dirigindo ou lendo, a história vem. E ter essa certeza alivia muito a ansiedade. Basta viver naturalmente, deixar as ideias maturando na cabeça.


IA - A escrita pode ser um ofício solitário. Você, no entanto, pode sempre contar com o apoio peculiar da Maia durante suas horas de trabalho srsrs. Além de poder contar com ela, quais são os seus rituais ou métodos para manter a disciplina e a inspiração fluindo durante o processo de criação? Nota: Maia é a cachorra de estimação de Hugo.


HUGO -  Quem quer contar histórias tem de consumir histórias. E não no intuito de copiar, mas de criar referências. Hoje tudo que leio e assisto faz parte do meu trabalho. Filtro bastante o que consumo. Anoto tudo que passa pela minha cabeça enquanto consumo esses conteúdos. Quando vejo um filme, penso: “E se essa história tivesse seguido pra tal lado?”, “E se tal personagem morresse, como o protagonista reagiaria?”. E, acima de tudo, eu amo conversar. Por sorte tenho muitas trocas boas que me fazem enxergar as coisas de um jeito diferente. Ou seja, o melhor método é viver como um escritor. E isso significa estar atento a tudo o tempo todo. E o ritual que complementa esse estilo de vida é ter sempre um caderninho para anotar pensamentos (pode usar o celular, mas eu sou velho e gosto de cadernos).


IA - Falando em inspiração, que autores ou obras de ficção científica foram as suas maiores inspirações para este projeto? E existe algum roteirista que você admira e que te inspira nessa nova jornada? (Não vale citar Tarantino rsrs)


HUGO - Duna é um dos meus livros favoritos (se não for o favorito) há muito tempo. E ele teve duas fases na minha vida. A primeira vez que eu li era garoto, me amarrei na aventura, no universo. Na segunda vez que li, já com menos cabelo na cabeça, foi muito melhor. Notei as críticas do Frank Herbert ao fanatismo religioso, colonialismo e tudo mais. O cara é um gênio. Só de pensar que se não fosse ele provavelmente não existiria Star Wars, a maior franquia do cinema...


Enfim, eu sempre li de tudo. Agora tenho lido mais ficção científica para pegar referências. Mas, antes de começar a escrever, já era fã do Isaac Asimov. Tenho uma coleção boa dele. E eu, como bom pessimista, amo distopias. 1984, Admirável Mundo Novo, Fahrenheit 451... Quanto aos roteiristas, imagino que esteja perguntando sobre ficção científica também. Quem me chama mais atenção hoje, de longe, é o Denis Villeneuve. Amo o Blade Runner dele. A Chegada é uma obra prima. Duna 2 é um esculacho. E saindo um pouco do sci-fi, o primeiro filme dele, Incêndios, é absurdo. Não dá para deixar o James Cameron de fora quando se fala de ficção científica, né? Minha infância foi baseada em assistir Exterminador do Futuro 2 em um looping infinito. Menção especial para o Dan e Tony Gilroy, que escreveram e dirigiram alguns dos episódios da melhor coisa de Star Wars já feita: Andor. E que ganharam o Emmy’s de melhor roteiro esse ano com muito merecimento. Imagino que ainda vamos ouvir falar muito neles.


IA - Olhando para trás, para o Hugo que estava iniciando na advocacia, o que você diria para ele sobre a jornada que estava por vir? E o que o Hugo de hoje espera para o futuro?


HUGO - Você conhece o meme mais famoso de The Office, né? O Michael gritando “OH, NO, GOD, NO, PLEASE, NO”. Esse seria o Hugo do presente falando com o Hugo do passado na hora da matrícula no curso de direito.


Eu espero pessoas lendo um capítulo de uma história minha e perguntando “O que acontece com tal personagem? Ele está vivo? Eles vão se casar? ” A primeira vez que isso aconteceu foi uma das melhores sensações que já tive. Ainda não sei explicar o porquê, mas falar sobre o que eu crio é apaixonante. Tão apaixonante quanto falar sobre minhas obras favoritas (e olha que sou muito fervoroso nisso).


O Hugo de hoje espera muitas dificuldades, não é uma jornada fácil. Mas não vou desistir de viver disso. Posso ter que arrumar outros empregos no meio do caminho (o que é provável) e talvez eu nunca consiga viver SOMENTE disso. Mas nunca vou parar de tentar.


IA - Muitos podem se identificar com sua história de recomeço e coragem para seguir uma paixão. Qual conselho você daria para alguém que quer migrar de carreira para uma área mais criativa, mas tem medo do que vai encontrar?


HUGO -  Bom, se você tem medo, está no caminho certo. Quem não tem medo faz bobagem. Só não pode deixar o medo te paralisar. É um processo muito individual. Eu, por exemplo, não pagava INSS para aposentadoria. Fiz cursos de investimento e sempre que dava botava uma grana para render, pensando na velhice. Acabou que esse dinheiro está servindo para me manter enquanto estou sem renda. Às vezes é desesperador, mas estava desesperador antes também... Se não tem dinheiro guardado, mas tem uma rede de apoio (pai, mãe, marido, esposa) não tenha vergonha de usufruir desse privilégio. Sério, é bobagem. Seu sonho tem que ser maior que isso. Se não tem, comece aos poucos a transição. Não peça demissão de cara e vá vender sua arte na praia. Vá estudando aos poucos, deixe a ideia ganhar força. Mas, definitivamente, mude. A geração dos nossos pais era a geração da estabilidade. A nossa é a da mudança. Até porque nunca sabemos o que vai mudar no mercado, quais tecnologias vão surgir e nos obrigar a trocar de área. Leia sobre tudo, crie capital intelectual, deixe seu cérebro marombado. Assim você se adapta a qualquer coisa.


IA - Por fim, onde os seus futuros leitores podem te encontrar para acompanhar de perto a jornada até a publicação de “O Gene da Rebeldia" e conhecer melhor os bastidores do seu trabalho?


HUGO - Por enquanto no Instagram (@bianorhugo). Está devagar, mas vou começar a postar pelo menos duas vezes por semana (e stories direto). Mostrar o processo criativo, fazer resenha de livros, filmes. Mostrar os bastidores de eventos e o que mais der na telha. Também vou marcar presença em outra rede social. TikTok. Youtube, quem sabe? De qualquer forma, quando acontecer, vou avisar no Instagram. Para ser escritor hoje, como na maioria das outras profissões, tem de ser meio (bastante) influencer também, né?


Gostaria de agradecer mais uma vez ao autor Hugo Bianor pela gentileza e por nos apresentar sua mais nova obra. E se você é autor independente e busca um espaço para promover o seu trabalho entre em contato no e-mail igorandrepds@gmail.com.

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